As dores e emoções de acompanhar por dentro a atuação de Bio-Manguinhos contra a pandemia da COVID-19
Era final de janeiro de 2020 quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o surto de coronavírus. Inicialmente, o Brasil acompanhou à distância tudo o que acontecia, principalmente na China e Itália, onde tínhamos um triste cenário de muitas mortes e nenhuma perspectiva de melhora, mas, ainda assim, seguíamos com aquela falsa impressão de que não seríamos atingidos.
Em 11 de março daquele ano, a situação foi declarada como uma pandemia pela OMS, o que fez com que o Governo brasileiro estabelecesse medidas de prevenção e contenção, que começaram a valer a partir de 16 de março.
Recordo-me que, logo após o posicionamento do Governo Federal, minha gestora, Alessandra Ferreira, pediu uma reunião emergencial para 16 de março. Nessa reunião, foram estabelecidas diversas medidas, dentre as quais uma trouxe grande impacto diretamente na minha rotina: eu ficaria responsável por estruturar a testagem COVID-19 e a vacinação da gripe dos colaboradores de Bio-Manguinhos, em contrapartida deixaria a gestão de Ambiente Organizacional, para retornar à área na qual atuei por 11 anos, algo que não esperava que fosse acontecer.
Naquele momento, tivemos que começar do zero, pois não havia referenciais teóricos nem locais com experiência nessa área no Brasil, o que fez com que uníssemos forças dentro da Fiocruz e encontrássemos a solução. Em menos de um mês, já estávamos rodando a testagem RT-PCR no campus da instituição, uma ação de prevenção que permitiu que reduzíssemos a transmissibilidade da COVID-19 no local e, até mesmo, nos lares dos colaboradores. Em poucos meses, o Posto de Testagem COVID-19 de Bio-Manguinhos se tornou referência. Fomos responsáveis por capacitar os profissionais da Cruz Vermelha, prestamos assessoria à Prefeitura do Rio de Janeiro para implementação de postos de testagem nas comunidades e fomos convidados a participar do Comitê de Testagem da Fiocruz.
Em meio a toda essa correria, um dos pontos que me marcaram foi atuar presencialmente, quando praticamente toda a população estava em lockdown, pois era um cenário melancólico trafegar de carro pelas ruas vazias, além de não ter contato com meus pais e filha durante um bom tempo, nos limitando a conversas pelo celular para amenizar a dor da saudade. Mas procurava focar na missão que estávamos cumprindo e nas vidas que estávamos salvando.
Perdi a conta de quantas vezes realizei esses trajetos chorando de tristeza por tudo o que estava acontecendo ao meu redor, pois, além de acompanhar os noticiários, fazíamos o acolhimento e acompanhamento dos colaboradores adoecidos por COVID-19 e dos seus familiares. Era inevitável lidarmos com internações, quadros que não evoluíam bem e, o pior, com óbitos. Mesmo nessa correria toda, essas situações por si só eram únicas, e a cada vez que se repetiam eram um “mix” de dor e impotência momentânea, mas a certeza de que estávamos trabalhando por dias melhores em médio e longo prazo.
Ainda tive a missão de organizar o inquérito epidemiológico, para promover a testagem em massa de todos os colaboradores da Fiocruz em três momentos, montando uma equipe de voluntários que não só fizeram tudo acontecer com excelência, como também novos laços de amizades foram formados nesse período.
Em dezembro de 2020, recebi o convite para assumir a gestão da Seção de Medicina do Trabalho, novamente, o que prontamente aceitei, pois sabia que ainda tínhamos muitos desafios pela frente. E os desafios não paravam de aparecer, como: campanha de vacinação contra a COVID-19 (que foi gratificante demais), ampliação da testagem, campanha de vacinação da gripe, lidar com novas variantes e tantas outras demandas.
Poderia discorrer por diversas laudas sobre o tanto de experiências que vivenciei no período da pandemia, mas não poderia deixar de mencionar algumas que foram gratificantes, como ter sido voluntário na produção de testes rápidos de COVID-19 e vivenciado de perto o desenvolvimento dessa vacina. Acompanhamos com ansiedade e esperança a parceria com a AstraZeneca e toda a mobilização para nos estruturarmos internamente, quer seja na construção de novos prédios, na modernização de nossas áreas de produção e desenvolvimento, na contratação de pessoal, na parceria com empresas privadas etc. Foi emocionante demais quando começaram a sair os primeiros lotes de nossa vacina, pois ali estava depositada a esperança da população brasileira, E o mais importante, com um produto Fiocruz, com nosso suor e dedicação, algo que, certamente, levarei para toda minha vida, e que fez com que os colaboradores sentissem um enorme orgulho de ser Fiocruz.
Por fim, deixo meu agradecimento a todos que estiveram comigo nessa batalha, pois os levarei sempre em meu coração, e obviamente um agradecimento especial a minha filha e a Deus, que permitiram que eu suportasse tanta coisa nesse período e continuasse de pé.